Projeto “52 Mulheres em 2025 – MEV, MulheresEmViagem.pt”. A história de uma mulher, por cada semana do ano. Durante o ano de 2025, o MulheresEmViagem.pt faz uma homenagem a Mulheres de todo o Mundo, de vários países, de várias áreas de formação, que se tornaram referências. Algumas já não estão entre nós, mas muitas outras ainda estão a transformar o nosso mundo, dia após dia, com o seu esforço e trabalho por um mundo mais igualitário! Por um mundo com mais referências femininas, sobretudo em áreas que nos estiveram vedadas durante séculos (milénios, por vezes…).
Shirin Ebadi é uma das vozes mais marcantes do ativismo mundial. Primeira mulher juíza no Irão pós-revolução, defensora incansável dos Direitos Humanos, advogada de mulheres e crianças, escritora e Prémio Nobel da Paz em 2003, Ebadi tornou-se um símbolo global de resistência pacífica. A sua vida é um testemunho de coragem e uma verdadeira viagem – física, emocional e intelectual – por caminhos onde se luta diariamente contra a injustiça, o autoritarismo e a desigualdade.
Neste artigo Mulheres em Viagem, celebramos a história de Shirin Ebadi e o impacto profundo que deixou no Mundo. Uma mulher que não só transformou o sistema legal iraniano, como também inspirou milhares de ativistas, especialmente mulheres, a levantarem a voz. Este é o seu percurso.
Da infância em Hamadã à paixão pela justiça
Shirin Ebadi nasceu a 21 de junho de 1947 em Hamadã, no Irão, numa família que valorizava a educação, a ética e a responsabilidade social. Ainda criança, mudou-se com a família para Teerão, onde cresceu num ambiente intelectual aberto, que lhe permitiu desenvolver pensamento crítico e a convicção de que todas as pessoas merecem igualdade perante a lei.
Determinada a construir uma carreira numa área dominada por homens, terminou o curso de Direito na Universidade de Teerão em 1969. Seguiu-se rapidamente o exame da magistratura. Com apenas 23 anos, tornou-se uma das primeiras mulheres do país a exercer como juíza: uma conquista pioneira e histórica que mostrava o potencial de uma geração de mulheres iranianas altamente qualificadas e determinadas a marcar presença na vida pública.
A Revolução Islâmica e o retrocesso
Em 1979, a Revolução Islâmica mudou a vida dos iranianos e de Shirin Ebadi, de forma abrupta. As novas autoridades religiosas consideravam que uma mulher não podia exercer funções judiciais. Ebadi foi afastada do seu cargo, despromovida a escriturária e obrigada a assistir a julgamentos presididos por homens menos experientes do que ela.
Esta decisão marcou profundamente a sua visão do mundo e reforçou o seu compromisso com os direitos das mulheres no Irão. Em vez de recuar, decidiu estudar, escrever e lutar por formas de continuar a contribuir para a justiça social. Regressou à advocacia no início da década de 1990, depois de anos de proibições e entraves impostos pelo Estado.
A advogada das mulheres e das crianças
Quando voltou a poder exercer como advogada, Ebadi escolheu defender os grupos mais vulneráveis do país: mulheres, crianças, presos políticos e vítimas de violência ou discriminação. Tornou-se rapidamente uma referência internacional devido ao seu trabalho em casos extremamente delicados.
Entre os processos mais conhecidos encontram-se:
- Casos de feminicídio e violência doméstica, defendendo mulheres que eram vítimas de abusos e que a lei iraniana tratava como cidadãs de segunda categoria.
- Defesa de crianças vítimas de abusos, numa época em que o tema era quase tabu no país.
- Representação de famílias de intelectuais e jornalistas assassinados na década de 1990, denunciando crimes políticos e violações de direitos fundamentais.
O seu trabalho era muitas vezes realizado sob risco pessoal. Foi alvo de vigilância, ameaças e até detenções arbitrárias. Ainda assim, manteve-se firme. Para Ebadi, o silêncio nunca foi opção.
Fundação do Centro para a Defesa dos Direitos Humanos
Em 2002, Shirin Ebadi fundou o Centro para a Defesa dos Direitos Humanos, uma organização não-governamental dedicada a promover o Estado de Direito, apoiar vítimas de violações dos direitos humanos e monitorizar processos políticos.
A iniciativa foi considerada uma ameaça pelos líderes iranianos, que viam em Ebadi não apenas uma jurista, mas uma força mobilizadora com impacto internacional. Em 2008, o Centro foi invadido e encerrado pelas autoridades. Muitos dos seus membros foram perseguidos ou detidos.
Contudo, esta repressão só deu mais visibilidade à causa de Shirin Ebadi e ao seu trabalho a nível global.
Nobel da Paz: reconhecimento mundial para uma luta local
Em 2003, Shirin Ebadi tornou-se a primeira mulher muçulmana e a primeira iraniana a receber o Prémio Nobel da Paz. O comité distinguiu-a pela sua “promoção da democracia, dos direitos humanos e, especialmente, pelos esforços pioneiros pelos direitos das mulheres e das crianças”.
O Nobel reforçou a sua posição como uma das mais influentes ativistas do mundo e deu novo impulso ao movimento de mulheres iranianas, num momento em que o país vivia tensão política e fortes restrições às liberdades civis.
Para Ebadi, o prémio nunca foi um ponto de chegada, mas sim um instrumento de amplificação. Com ele, passou a ter mais capacidade de denunciar abusos e mobilizar organizações internacionais.
Exílio forçado e o compromisso que nunca esmoreceu
Em 2009, após as eleições contestadas no Irão e a repressão violenta de manifestações, Shirin Ebadi viu a sua segurança ameaçada. Estava fora do país quando os protestos eclodiram — e foi aconselhada pelos colegas a não regressar. As autoridades confiscaram os seus bens, encerraram escritório, interrogaram familiares e tentaram intimidá-la de várias formas.
Desde então, Shirin Ebadi vive em exílio — primeiro no Reino Unido, mais tarde circulando por diferentes países devido ao seu trabalho académico e ativista. Ainda assim, continua a ser uma das vozes mais firmes contra as violações de direitos humanos no Irão. O exílio não a silenciou; apenas lhe deu novas plataformas de ação.
Escritora, professora e ativista global
Além do trabalho jurídico, Ebadi é autora de diversos livros essenciais para compreender o ativismo no Médio Oriente e os desafios das mulheres iranianas. Entre eles destacam-se “Iran Awakening”, “Until We Are Free” e “The Golden Cage”. As suas obras combinam memória pessoal, análise política e reflexões sobre justiça, liberdade e resistência.
Ebadi também tem participado em conferências, programas académicos e organizações internacionais que reforçam o papel da sociedade civil, especialmente de mulheres, na construção da democracia. a lutar hoje.


