Em 2025, o Prémio Nobel da Paz foi entregue a María Corina Machado, uma engenheira da Venezuela que se tornou símbolo da luta pela liberdade e pela democracia na Venezuela. O reconhecimento internacional chegou depois de mais de duas décadas de resistência, perseguições e coragem, num dos contextos políticos mais desafiantes da América Latina. A sua história é também a história de uma mulher que transformou dor em força, inspirando milhões dentro e fora do seu país.
Quem é María Corina Machado?
Nascida em Caracas, a 7 de outubro de 1967, María Corina Machado cresceu numa família de empresários da indústria siderúrgica. Licenciou-se em Engenharia Industrial pela Universidade Católica Andrés Bello e mais tarde especializou-se em Finanças. Mas o que viria a marcar a sua trajetória não seriam os números nem as empresas: seriam as pessoas.
Desde jovem, envolveu-se em projetos sociais e cívicos, como a Fundação Atenea, dedicada a crianças de rua na capital venezuelana. Determinada e movida por um forte sentido de justiça, fundou também o movimento Súmate, uma organização que promove a transparência eleitoral e o exercício da cidadania.
Este trabalho chamou a atenção internacional e também a ira do regime de Hugo Chávez, que a acusou de “traição à pátria” por defender auditorias independentes em processos eleitorais.
Da engenharia à resistência política
Em 2010, María Corina foi eleita deputada à Assembleia Nacional, obtendo uma das votações mais expressivas da história recente da Venezuela. No Parlamento, destacou-se pela defesa intransigente dos direitos humanos, da liberdade de imprensa e da separação de poderes.
Mas o regime não tardou em retaliar: em 2014, foi destituída do cargo e proibida de exercer funções públicas. A exclusão política, porém, não a silenciou. Pelo contrário, transformou-a numa voz ainda mais audível: Maria continuou a denunciar os abusos do governo, a repressão e o colapso económico e humanitário que assolam o país há anos.
Tornou-se uma das principais líderes da oposição e uma referência moral para milhões de venezuelanos que sonham com eleições livres e com o regresso da democracia.
O Nobel da Paz 2025 e o reconhecimento mundial
Em 2023, María Corina Machado candidatou-se às primárias da oposição venezuelana e venceu com mais de 90% dos votos. O resultado refletiu o apoio massivo da população ao seu projeto político e à sua integridade pessoal.
No entanto, foi impedida de concorrer nas presidenciais de 2024 por decisão do regime, que a inabilitou administrativamente. Mesmo sem poder estar no boletim de voto, não desistiu da luta.
Apoiou outro candidato da oposição, mobilizou milhões de pessoas e tornou-se a principal voz de um movimento que exigia eleições transparentes. O seu papel foi crucial para manter o processo pacífico e mobilizar observadores internacionais.
O Comité Nobel da Paz justificou a escolha de María Corina Machado pela sua “dedicação incansável à promoção dos direitos democráticos do povo da Venezuela e pela sua luta pacífica por uma transição justa e democrática”.
A distinção reconhece não apenas a sua liderança política, mas também o seu exemplo humano: o de uma mulher que enfrentou prisões arbitrárias, ameaças e difamação, mas nunca abdicou da esperança.
O significado do Nobel da Paz para as mulheres
O Nobel da Paz 2025 é também uma vitória simbólica para as mulheres. Num mundo onde a política continua a ser dominada por homens, María Corina Machado demonstrou que a liderança feminina pode ser firme e compassiva, racional e emocional ao mesmo tempo.
A sua forma de liderar baseia-se na escuta, no diálogo e na convicção de que a mudança verdadeira só acontece quando é inclusiva. “A liberdade não é um privilégio — é um direito inalienável”, declarou após o anúncio do Nobel.
Para milhares de mulheres na América Latina e no Mundo, o seu percurso representa resiliência e coragem em tempos de escuridão. Mostra que o empoderamento não é apenas um conceito: é uma atitude perante a vida. É resistir, mesmo quando tudo parece perdido.
A sua trajetória mostra que as mulheres podem ser protagonistas de transformações históricas, mesmo em contextos hostis. O seu legado vai muito além da política: é uma lição sobre fé, determinação e amor pelo seu povo.
As 20 mulheres que ganharam o Prémio Nobel da Paz até 2025
Desde 1901, apenas vinte mulheres foram distinguidas com o Prémio Nobel da Paz, entre mais de uma centena de laureados. Cada uma delas abriu caminho, defendendo causas humanas, sociais e políticas com coragem e determinação.
A primeira foi Bertha von Suttner, em 1905, escritora e pacifista austríaca cuja obra inspirou o próprio Alfred Nobel. Seguiu-se Jane Addams, em 1931, pioneira dos direitos sociais e da paz internacional, e Emily Greene Balch, em 1946, reconhecida pelo seu papel diplomático e pela defesa dos direitos humanos após a Segunda Guerra Mundial.
Nos anos 1970, duas mulheres da Irlanda do Norte, Betty Williams e Mairead Corrigan, partilharam o prémio por fundarem o movimento Peace People, símbolo de reconciliação durante o conflito irlandês. Em 1979, o mundo aplaudiu Madre Teresa de Calcutá pelo seu trabalho junto dos mais pobres, e em 1982, Alva Myrdal, da Suécia, foi distinguida pela sua contribuição para o desarmamento global.
A década de 1990 trouxe nomes poderosos: Aung San Suu Kyi (1991), de Myanmar, por defender a democracia através da não violência; Rigoberta Menchú Tum (1992), da Guatemala, pelos direitos indígenas; e Jody Williams (1997), pelos esforços internacionais contra as minas terrestres.
Já no século XXI, novas vozes femininas emergiram: Shirin Ebadi (2003), do Irão, pela defesa das mulheres e das crianças; Wangari Maathai (2004), do Quénia, pela ligação entre ecologia, democracia e paz; e, em 2011, Ellen Johnson Sirleaf, Leymah Gbowee e Tawakkol Karman, três mulheres africanas que simbolizaram a força feminina na reconstrução pós-guerra e na Primavera Árabe.
Em 2014, Malala Yousafzai tornou-se a mais jovem laureada de sempre, pela sua luta pela educação das raparigas no Paquistão. Em 2018, Nadia Murad, sobrevivente yazidi, deu voz às vítimas de violência sexual usada como arma de guerra.
Mais recentemente, Maria Ressa, das Filipinas (2021), foi premiada pela defesa da liberdade de imprensa, e Narges Mohammadi, do Irão (2023), pela resistência aos abusos de poder e pelos direitos das mulheres.
Em 2025, María Corina Machado junta-se a este grupo extraordinário de mulheres que mudaram o Mundo e torna-se um símbolo contemporâneo da coragem e da resistência democrática.