Projeto “52 Mulheres em 2025 – MEV, MulheresEmViagem.pt”. A história de uma mulher, por cada semana do ano. Durante o ano de 2025, o MulheresEmViagem.pt faz uma homenagem a Mulheres de todo o Mundo, de vários países, de várias áreas de formação, que se tornaram referências. Algumas já não estão entre nós, mas muitas outras ainda estão a transformar o nosso mundo, dia após dia, com o seu esforço e trabalho por um mundo mais igualitário! Por um mundo com mais referências femininas, sobretudo em áreas que nos estiveram vedadas durante séculos (milénios, por vezes…).
Liliʻuokalani, nascida Lydia Liliʻu Loloku Walania Wewehi Kamakaʻeha em 2 de setembro de 1838, ficou para a História como a primeira e única rainha reinante do Hawai. Foi também a última monarca do Reino do Hawai, antes da anexação forçada do arquipélago aos Estados Unidos da América. Figura de grande determinação, sensibilidade artística e profunda ligação ao seu povo, Liliʻuokalani simboliza até hoje a resistência feminina e cultural contra a opressão colonial.
A sua vida é marcada por contrastes: por um lado, uma princesa educada no seio da elite havaiana, com acesso a cultura e música; por outro, uma mulher que enfrentou golpes políticos e traições internas, mas que nunca deixou de lutar pela autonomia do seu povo.
Infância e educação de uma futura líder
Liliʻuokalani nasceu em Honolulu, numa época em que o Hawai era um reino independente, embora cada vez mais influenciado por interesses estrangeiros, sobretudo americanos e europeus. Como era tradição entre a nobreza havaiana, foi entregue a uma família de altos chefes para ser criada, prática conhecida como hānai.
Recebeu uma educação formal, aprendeu inglês e foi exposta à religião cristã, além de manter uma forte ligação às tradições e espiritualidade do seu povo. Esta combinação de culturas refletir-se-ia mais tarde na sua visão política e artística, tornando-a uma ponte entre dois mundos.
Liliʻuokalani e a música: a rainha compositora
Poucos monarcas na História foram também artistas reconhecidos. Liliʻuokalani destacou-se como compositora talentosa, autora de mais de 150 músicas e hinos, muitos deles inspirados na paisagem e espiritualidade havaiana.
A sua composição mais célebre é “Aloha ʻOe”, canção que se tornou símbolo do Hawai e ainda hoje é interpretada em todo o Mundo. A música, comovente e nostálgica, fala de despedidas e encontros, mas é também lida como uma metáfora para a separação do povo havaiano da sua soberania.
O caminho para o trono
Em 1877, após a morte do seu irmão, o rei Kalākaua, Liliʻuokalani tornou-se herdeira do trono havaiano. Quando este faleceu em 1891, ela ascendeu ao trono como rainha do Hawai.
O início do seu reinado foi turbulento. O poder político havaiano já estava enfraquecido devido à influência crescente de empresários americanos ligados à plantação de açúcar. Estes homens controlavam grande parte da economia e queriam alinhar o Hawai com os Estados Unidos para benefício próprio.
A Constituição da Rainha
Determinada a proteger a autonomia do arquipélago, Liliʻuokalani tentou implementar uma nova Constituição que devolvesse poder ao povo havaiano e limitasse a influência estrangeira. A Constituição em vigor, conhecida como “Bayonet Constitution” (Constituição da Baioneta), de 1887, tinha sido imposta sob ameaça militar ao rei Kalākaua e reduzia drasticamente o poder da monarquia, favorecendo estrangeiros residentes no Hawai.
A proposta da rainha, em 1893, foi recebida como uma ameaça direta pelos empresários americanos e pelos seus aliados políticos. Esta ousadia feminina, num mundo dominado por homens, mostrou a sua coragem e visão estratégica: uma mulher que queria recuperar a soberania para o seu povo.
O golpe de Estado de 1893
Em janeiro de 1893, um grupo de homens de negócios americanos, com o apoio dos fuzileiros navais dos Estados Unidos, organizou um golpe de Estado que depôs a rainha. Liliʻuokalani foi obrigada a abdicar, sob protesto, afirmando que o fazia apenas para evitar derramamento de sangue entre o seu povo.
A sua deposição marcou o fim da monarquia havaiana. Em 1898, os Estados Unidos formalizaram a anexação do Hawai, transformando o arquipélago em território americano.
Prisão e resistência pacífica
Após o golpe, Liliʻuokalani foi acusada de conspirar contra o novo Governo e acabou presa no Palácio ʻIolani, onde permaneceu sob vigilância durante quase oito meses. Durante esse período de confinamento, dedicou-se à escrita e à música.
Foi nesse contexto que compôs algumas das suas obras mais emocionantes e também que começou a escrever as suas memórias, publicadas em 1898 com o título “Hawaii’s Story by Hawaii’s Queen”. Nesse livro, a rainha deu voz à sua versão dos acontecimentos, denunciando as injustiças sofridas pelo seu povo e registando para a História a luta pela soberania.
O legado de Liliʻuokalani
A rainha Liliʻuokalani não conseguiu restaurar o trono nem impedir a anexação do Hawai. Contudo, o seu legado permanece vivo até hoje em várias dimensões:
- Resistência feminina: foi uma mulher que, em pleno século XIX, desafiou interesses coloniais e se manteve firme nos seus princípios.
- Identidade cultural: através da sua música, preservou e promoveu a língua e a cultura havaiana.
- Símbolo político: ainda hoje, movimentos de soberania indígena havaiana evocam o seu nome e a sua memória como símbolo de luta e dignidade.
Liliʻuokalani como inspiração para mulheres
Além da sua importância histórica, Liliʻuokalani é uma figura de inspiração para mulheres de todo o Mundo. A sua trajetória mostra como a liderança feminina pode ser marcada pela coragem, pela diplomacia e pela defesa da identidade cultural.
A rainha havaiana enfrentou uma situação de grande adversidade – perder o trono, ser humilhada publicamente, viver o exílio dentro da sua própria terra – mas nunca deixou de lutar de forma pacífica e criativa. A sua postura ensina que a resistência pode assumir muitas formas, desde a política até à arte.
Liliʻuokalani morreu a 11 de novembro de 1917, em Honolulu, já sob domínio americano. Apesar de não ter recuperado o trono, a sua memória continua viva como símbolo de dignidade, cultura e força feminina.