*O que são as “Conversas do Confinamento”? Perante um novo confinamento geral, em Portugal, iniciado a 15 de janeiro de 2021, decidi começar uma série de entrevistas, de forma a dar a conhecer o trabalho de muitas mulheres, em várias áreas, mas sobretudo no trabalho em prol do outro, na saúde, sexualidade, no desenvolvimento pessoal, no auto-conhecimento e nas viagens, claro!
Entrevistas que trouxessem conhecimento e inspiração durante todo o confinamento.
Essas entrevistas foram o primeiro passo para criar o site Mulheres em Viagem, que é um site irmão do Viaje Comigo.
Mulheres em Viagem… porque a vida é uma viagem!
E quem sou eu? Sou a Susana Ribeiro, jornalista, comunicadora, viajante e fundadora do site de viagens Viaje Comigo e do Mulheres em Viagem. E a entrevistadora das “Conversas do Confinamento”.
Sejam bem-vind@s ao Mulheres em Viagem.pt – uma Comunidade de e para Mulheres Extraordinárias… como Tu!
TODA A ENTREVISTA FOI TRANSCRITA E ESTÁ AQUI ABAIXO PUBLICADA
Quem é Alia Mira?** 35 anos, filha e neta de emigrantes no Canadá, nasce na cidade de Winnipeg em 1985, vindo para Portugal com apenas 1 ano de vida. Formou-se em Ciências Farmacêuticas pela Universidade de Coimbra em 2008, exercendo desde então, em farmácia comunitária. Em 2019 cria a DOC, uma revista digital de saúde, à qual se dedica em part-time, estabelecendo contactos com outros profissionais de saúde. Colabora, desde o ano passado, com a Linha SNS24, na triagem de doentes de COVID-19. Segue-a no Instagram.
Susana Ribeiro: Olá a todos, muito boa tarde. Continuamos com estas Conversas do Confinamento. Em que vamos explorando um bocadinho do universo feminino, todos os dias, mas não significa que isto sejam só conversas para as mulheres verem. Os homens também são bem-vindos aqui.
Hoje, tenho comigo a Alia Mira, que é farmacêutica e que é uma das responsáveis do projeto MagDoc uma revista digital de saúde e, portanto, eu vou tê-la, hoje, aqui – e, depois de amanhã a Celine que é a outra parceira do projeto – a falarmos de coisas muito relacionadas com o universo feminino. Porque foi essa a minha proposta: durante o confinamento termos aqui conversas que se debruçam especialmente sobre o universo feminino mas não só. ,E hoje vimos falar de uma coisa muito particular das mulheres que é a menstruação e vamos falar de mitos, muitas coisas, da ovulação e portanto temos aqui a Alia que tem-se debruçado (sobre estes temas) também nesta revista.
Vou começar por perguntar como e quando é que surgiu para depois irmos ao tema em sim. Eu descobri-vos no Instagram e comecei a seguir e vi que abordavam temas muito interessantes e resolvi chamar-vos aqui. Não vos conhecia e estou a conhecer. Este é o novo conhecer desde Março de 2020… conta-me u bocadinho como surgiu a MagDoc.
Alia Mira – Antes de mais, quero agradecer o convite, é uma honra pertencer ao painel de mulheres que tens vindo a entrevistar. E que tem sido muito interessante. Eu sou farmacêutica, formada pela Universidade de Coimbra, já vai para – se as contas não me falham – 13 anos e trabalho desde então em farmácia comunitária. A par disto, agora em contexto de pandemia, estou também a colaborar com a Linha SNS 24, a triar doentes de Covid-19, que agora são mais do que muitos, infelizmente.
E para além de tudo isso, há dois anos, surgiu a ideia de criar uma revista de saúde digital, porque achava que, apesar de existir muita informação sobre saúde, na internet, ela é muito vaga e muito vasta e, às vezes, pouco credível. E pela minha prática clínica, chegavam-me utentes com “olhe, eu fui ver o Google e ele diz-me que é isto”. Então, resolvi criar uma revista, cujas edições saem todos os meses no nosso site, com um tema de saúde central que, depois, ao longo desse mês é abordado mais profundamente, nas nossas redes sociais. Com artigos, com esclarecimentos a dúvidas que me chegam. Chamamos até nós outros profissionais de saúde das áreas para que possamos completar a informação e dar às pessoas mais e melhor informação. Para que todos saibamos mais, para que todos possamos escolher, com mais informação, e possamos também exigir… muitas vezes, dos profissionais de saúde… exigir melhores respostas para os problemas.
SR – Sim, se estivermos mais informadas, saberemos também porque caminho podemos seguir.
AM – Exato. E questionar às vezes os próprios profissionais. Às vezes é um bocadinho: é este problema – é esta resolução. Mas às vezes não é bem assim. E, se questionarmos, melhor ainda.
SR – Então, surgiu o projeto que vos deve dar imenso trabalho.
AM – É o nosso part-time mas dava como um full-time.
SR – Como responsável de um site sei bem o trabalho que vocês devem ter ali. De conteúdos e de procurar uma informação credível… que está muito dispersa. Que muitas vezes queremos encontrar e é difícil… lá está, é credível? Não é?…
AM – Base cientifica, credível, fidedigna… para as pessoas serem orientadas no melhor sentido possível.
SR – Uma das piores coisas que se pode fazer é termos sintomas de alguma coisa e irmos ao Dr. Google.
AM – É o pior. Mais vale ir à farmácia.
SR – Na Farmácia deves ter muitas dessas histórias, das pessoas que chegam lá…
AM – Sim vários, com mezinhas. Que às vezes até resultam, mas cientificamente não são as mais indicadas. O melhor é mesmo consultar um profissional de saúde. Ou basta ligarem para as Farmácia, estamos todos acessíveis. O mais acessível possível. Depois, as pessoas assustam-se e, às vezes, sem razão para isso.
SR – Exatamente, podem pensar que é uma coisa muito mais problemática. E assim têm a ajuda dos profissionais, para fazerem ali uma triagem do que é o que poderá estar a sentir. Alia, hoje, é para falarmos sobre Menstruação. Reparei que tinham publicado no Instagram, uma coisa muito interessante. Ovulação: a menina dos olhos do ciclo menstrual. Acho que muitas de nós mulheres, achamos que o ciclo menstrual é igual para todas. E isso é a primeira diferença. Não é igual para todas.
AM – Completamente. É individual e é sensível ao estilo de vida de cada mulher. Mas, a menstruação é só a parte visível de too um ciclo de biofeedback que ocorre ao longo do mês. A menstruação é a parte chata, acho que ninguém gosta muito daqueles dias.
SR – Se pudéssemos, anulávamos aqueles dias, é um facto.
AM – Mas a parte invisível do ciclo é que é a parte gira da coisa. Porque é um feedback de hormonas, para que o ciclo leve o seu caminho e chegue depois à menstruação. Acho que, a maior parte das mulheres não deve saber que o ciclo menstrual começa no cérebro, porque é produzida uma hormona que se chama FSH, isto um bocadinho atrás para explicar o ciclo menstrual, para que posamos todos compreender. E tudo isto começa no cérebro, numa glândula muito pequenina que temos, a hipófise, e que segrega uma hormona que se chama FSH, ou folículo estimulante, e como o nome indica vai estimular o desenvolvimento de folículos nos nosso ovários. E, portanto, o desenvolvimento desses folículos vai originar a produção de uma hormona que é o estrogénio. O estrogénio, ali um bocadinho antes da ovulação, vai atingir o seu pico e por isso é que, nesses dias, abre-se a janela fértil. Ali meia dúzia de dias onde podemos engravidar, e onde nos sentimos mais energéticas, mais dinâmicas, mais sensuais, com maior libido, devido ao pico do estrogénio.
SR – E isso é mais ou menos quando?
MONITORIZAR O CICLO MENSTRUAL
AM – Depende de cada mulher. Aquela história que cada mulher tem um ciclo de 28 dias e que a meio, ao 14º ocorre a ovulação… ocorre em quase nenhuma mulher. Ocorre em 20%. Nas outras todas depende. Depende se te andas a alimentar bem mais ou menos, se dormes melhor, a tua higiene do sono, depende do copo de vinho que bebeste na sexta feira passada, depende de viagens, depende se foste para outro pais e estás em jetlag, depende de uma série de fatores, que se forem alterados. Se as tuas rotinas forem alteradas, vai-se refletir na ovulação e consequentemente na menstruação. Depois, o período está atrasado e as mulheres ficam alarmadas e vão à farmácia comprar teste de gravidez. É muto sensível ao estilo de vida de cada mulher. Por isso é que é tão importante monitorizar o ciclo, porque só assim, alem de termos um autoconhecimento do nosso corpo, também podemos sinalizar algumas questões de saúde. Por exemplo, as dores menstruais, que toda a gente acha que é super normal; a sociedade tende a normalizar as dores menstruais, que naqueles dias são dores de cair na cama. É totalmente errado. É claro que pode haver uma cólica, a dita cólica menstrual. O útero é um órgão em forma de pêra, oco. E, portanto, com músculo liso, e tem de contrair para expulsar a menstruação, e aí é normal que sintas uma dor ligeira a moderada. Uma cólica menstrual. Agora, dores menstruais incapacitantes, que alteram a tua qualidade de vida; que não te deixam fazer a tua rotina diária, são sempre sinal que algo que não está bem. E por isso, é tão importante monitorizar o ciclo e saber que estas questões não se tratam só com a pílula. R que podemos estar aqui a camuflar um diagnóstico. Uma endometriose, uma síndrome poliquístico, ovários poliquísticos, um simples desequilíbrio hormonal, pode causar isto.
SR – É preciso ter em atenção isso e é muito difícil nós medirmos a dor. Somos todas diferentes.
AM – Cada mulher tem o seu nível de suportar a dor. Mas se é uma dor que não te deixar fazer nada. Não te deixar ir trabalhar…
SR – Tinha uma amiga que tinha enxaquecas e tinha de ficar fechada em casa, sem luz do dia, nem nada. Durante dois dias.
AM – E isso é sinal que algo não está bem. É o teu corpo a dizer: alguma coisa não está bem. E o corpo é uma máquina fantástica. Tudo funciona em simbiose, em equilibro. E se há um sintoma, é um alerta. Um alarme a dizer alguma coisa não vai bem.
SR – Já me dizia há pouco tempo a ginecologista: nós não temos consciência do corpo. Só acabamos por ter consciência dele se nos doer alguma cosia. Estou a sentir o braço: quer dizer que o braço me está a doer. Portanto, algo de mau se passa com o braço. Vamos ver o que se passa, não ignoremos isso. Quando temos consciência de qualquer coisa, há que tratar. Achei muito interessante esse percurso que estavas a fazer dos ciclos. Então, podemos dizer que o dia 1 do ciclo é…
CICLO MENSTRUAL
AM – O dia 1 do ciclo é o primeiro dia da menstruação. A partir daí contas e o normal, em anos férteis, é teres um ciclo entre 25 e 35 dias. Há mulheres que têm ciclos curtos…
SR – O que é que isso significa? Quer dizer que ao final desse tempo, é que vem…
AM – É o primeiro dia da menstruação; o último, é o último dia antes da próxima menstruação.
SR – E depois esse ciclo significa que vai até ao primeiro dia da próxima menstruação.
AM – Vai à véspera da próxima menstruação.
SR – Isso significa que, por haver essas diferenças, também o período da ovulação possa ser diferente.
AM – Sim, claro. Exatamente. Está muito ligado também ao nível de progesterona de cada mulher. Dividimos o ciclo em duas partes: a primeira parte até à ovulação, onde há um pico de estrogénio, e depois na ovulação é libertado um óvulo, na trompa de Falópio, para eventualmente ser fecundado, por espermatozoides. Eventualmente ou não. O sítio no ovário onde saiu o óvulo forma uma glândula que vai produzir uma outra hormona, que é progesterona, que é a rainha da segunda parte do ciclo. E tem um pico na segunda parte do ciclo. É importantíssima porque, como o nome indica, irá proteger uma suposta gestação: pró-gestação. Vai-nos aquecer. A nossa temperatura basal, na segunda parte do ciclo é um bocadinho mais alta, e isto é um indicador de fertilidade. Cruzarmos os indicadores é o tal, que eu estava a dizer, da monitorização do ciclo. Na segunda parte do ciclo estamos mais quentes, mesmo que se fosse um ninho para caso haja a fecundação do óvulo, para ali acolhermos o óvulo fecundado. E há mulheres que têm a progesterona um bocadinho em baixo. Há mais tendência de termos mais em baixo do que elevada. E isso torna a segunda fase, a Fase Lútea – a primeira é a Fase Folicular – porque a glândula que precisa da progesterona chama-se corpo lúteo. E se o nível de progesterona está um bocadinho abaixo, a Fase Lútea vai ser mais curta, a ovulação ocorre mais cedo. E essa diferença resume um ciclo mais curto. É diferente de mulher para mulher.
SR – O é diferente de mulher para mulher. Há umas que sentem muito e outras não sentem. Eu, uns dias antes, adoro comer doces e salgados, coisas de extremos…
AM – Estás a falar da Tensão Pré-Menstrual, mas não é suposto haver TPM. Porque há flutuação hormonal, é suposto haver algumas mudanças, mas uma coisa muito subtil. Não é uma coisa de dois dias antes estarmos super irritadas, não é assim uma coisa de extremos. Pode haver flutuações subtis, porque estamos sensíveis às flutuações hormonais, mas não tem que ser… e lá está, as enxaquecas que estavas a referir da tua amiga, é sinal que algo não vai bem.
SR – E também isto associado… há-de haver meses que nem ligo a isso, e noutros sim…
AM – Uma alteração no estilo de vida, podes sentir a diferença em dois ou três ciclos seguintes.
SR – Que tipo de alterações? É aquilo que tu falavas: mais stress….
AM – Aliás, o stress tem as costas largas. É a forma como nós lidamos com o stress. Há pessoas que lidam melhor e outras pior. O stress tem muita influência; a hidratação, por exemplo; o útero por ser constituído por músculo e liso é muito sensível à hidratação. Se estiveres bem hidrata às vezes consegues reduzir estes sinais de pré-menstruação a zero. Boa hidratação, boa alimentação, boa higiene do sono, consegues reduzir bastante.
SR – Basicamente isso é controlar as hormonas…
AM – É, um bocadinho! É dar às hormonas o que elas querem. Que é uma boa alimentação, oito horas de sono, por noite…
SR – N verdade, isto de explicar muitas vezes a menstruação, principalmente para os homens – que não a têm – é difícil. Eu diria que a menstruação para totós é mais ou menos assim: o nosso corpo, todos os meses, nós dá uma ordem; vou-te criar tudo muito especial para receberes um bebé; mas nós não temos um bebé… eu digo que isto é uma falha enorme no nosso corpo: todos os meses!?
AM – É uma desilusão…
SR – Todos os meses, o corpo diz… ohhh não tem bebé. Vamos limpar isto.
AM – A progesterona é mesmo para isso. O muco cervical fica elástico, na ovulação, e mais transparente poder ter ali os espermatozoides à espera, para que possa sobreviver cinco dias – eles têm um tempo de vida de cinco dias…
SR – É verdade! Isso eu descobri há pouco e não é suficientemente falado… ou seja, um espermatozóide pode ficar ativo durante cinco dias! À espera do óvulo.
MENSTRUADA PODES ENGRAVIDAR…
AM– O nosso corpo é maravilhoso. Muda ali a consistência mo muco e eles ficam ali na trompa de Falópio à espera do óvulo. Por isso é que um dos grandes mitos em relação a este tema é que não se pode engravidar quando estás menstruada.
SR – Era outra das perguntas que eu ia fazer…
AM – A probabilidade é baixa. Mas a possibilidade está lá. É mesmo por esse factor. Pelo facto de os espermatozoides conseguirem sobreviver até cinco dias dentro do corpo da mulher. Imagina: tens relações sexuais não protegidas ali no último dia da menstruação. E és uma mulher com um ciclo menstrual curto. Portanto, a ovulação vai ocorrer mais cedo. E se, depois, cinco dias depois do sétimo dia, ovulares, tens ali o espermatozoide à espera que o óvulo chegue e surgem as gravidezes surpresa.
SR – Isso é um dos mitos e existem muitos. Havia uns muito engraçados… eu até gostava de descobrir de onde é que eles vêm. Montes de coisas, aliás, nos tornavam incapacitadas durante o período menstrual. Uma delas dizia, mas isto já muito antigo, uma mulher quando está menstruada não pode fazer bolos, porque os bolos vão sempre abaixo. Eu dir-te-ia assim, estamos no século XXI, mas eu garanto que ainda há pessoas que acreditam nisso e não fazem bolos…
AM – Lavar o cabelo, não se podia tomar banho naqueles dias… enfim!
SR – Tudo mentira e tentemos uma vida normal. Outra coisa muito interessante que tens estado aqui a reforçar e eu adoro…. monitorizar o ciclo menstrual pode trazermos até uma melhoria da qualidade de vida. Eu tenho uma aplicação, no telemóvel, mas lá está, dou-lhe o beneficio da dúvida, porque aquilo nunca acerta muito bem e vocês tinham na vossa revista digital isso: tenham cuidado porque as Apps, muitas vezes, podem…
AM – Pois, lá está. Depois aparecem as gravidezes surpresa. Muitas das aplicações, a não ser que seja mesmo uma aplicação de fertilidade, que cruze vários indicadores. Muitas vezes, tu calculas o dia da menstruação e depois passados 28 dias, vais ovular, e neste dia vais ter a próxima menstruação. Não é assim tão estanque. Não acontece em nenhuma mulher assim É sensível a uma data de fatores e só cruzando vários indicadores – pelo menos três – é que consegues prever uma janela fértil. Por isso é que há muitas mulheres – fora os problemas de infertilidade – que tentam e tentam, durante largos meses engravidar e não conseguem. A primeira causa é porque não consegue prever a janela de fertilidade. Nos só estamos férteis seis dias, ou homens todos os dias, ou todas as vezes que ejaculam são férteis. Nós é só ali seis dias, porque o óvulo só tem duração de 24 horas. Seis dias férteis num mês e a probabilidade de engravidar é baixíssima, é só 20 a 25%, se não me falha a percentagem.
SR – Daí se usar a palavra milagre… Um milagre da natureza.
AM – Portanto, o melhor para prever a janela fértil é cruzar três indicadores: a temperatura (como disse há pouco) a progesterona aumenta-nos um bocadinho a temperatura; mas esta também é um indicador, que não diz que a ovulação já passou, apenas nos dá a indicação que a ovulação aconteceu; se a temperatura está mais elevada, houve um pico progesterona, e se houve progesterona houve ovulação. Este por si só não nos diz a janela fértil. Diz que a ovulação aconteceu. Depois, ver o muco: um muco mais elástico; mais transparente, que permite a passagem dos espermatozoides. Mais elástico é aquele que se abrires assim, fica aqui o muco. E o colo do útero que fica mais macio – está à distancia de um dedo – ajuda a uma plantação de um óvulo. Cruzando estes três indicadores consegues prever uns seis dias da janela fértil.
TAMPÕES, PENSOS HIGIÉNICOS, COPOS MENSTRUAIS…
SR – Há pouco tempo, falava com umas amigas e a discussão era: vivemos com isto a vida toda… foram inventados os pensos higiénicos, os tampões, agora os copos menstruais, mas na verdade eu acho que evoluiu pouquíssimo. E já nem falemos do valor e do dinheiro que nós gastamos nessas coisas. Mas, eu acho que evoluiu pouquíssimo, porque começamos a obter mais informações e nem os pensos higiénicos nem os tampões são a coisa mais saudável do mundo, para nós usarmos.
AM – Nem mais ecológica…
SR – Exatamente. Ainda mais essa. Porque o copo menstrual veio mostrar essa parte mais ecológica. Eu estou a usar e posso dizer que foi uma colega minha (que sugeriu)… e agora parece que evangelizamos com o copo menstrual.
AM – Qual o teu feedback?
SR – Custou imenso nos primeiros meses e tinha muito receio de sair com aquilo, porque se mexesse e… Entretanto, passados uns 6 meses, portanto, foi uma transição …
AM – É preciso insistência e nem todas as mulheres se adaptam a produtos de recolha interna.
SR – Exatamente. Nós temos de descobrir qual o melhor e depois há um tamanho e pode não servir logo à primeira. Há para quem teve bebés e para quem não teve. Mas, agora, sim estou super adepta daquilo e, de facto, já o tenho há um ano e tal, e consigo ver todos os benefícios. A não ser que digam a alguns anos, aquilo é horrível e fazia-nos muito mal. Porque, nós recebemos tudo um bocadinho sem colocarmos muitas perguntas. E isto vem de autoridades de saúde…
AM – Sim, aceitamos um bocadinho as coisas, sem questionar…
SR – Isto é uma ligação… por causa do muco e de muitas mulheres usarem o penso diário, porque não conseguem olhar para a cueca e a cueca estar suja. É um erro, certo?
AM – Completamente! O muco cervical é como temos saliva na boca, ou como temos os olhos lubrificados. Senão, não dava. Se não tivéssemos saliva na boca, não dava. É a exatamente a mesma coisa. É um fluido corporal, totalmente normal. E, às vezes, o uso dos pensos diários até provoca maior corrimento. O corpo é espetacular e então, o penso diário vai aumentar a temperatura da vagina. Como aumenta a temperatura, o que é que ele faz. Uma descarga mais aquaosa para equilibrar a temperatura. Às vezes, o uso de pensos diários nem é recomendado, por isso mesmo. Porque as mulheres usam para não ter de estar a ver o muco, mas ainda produz mais muco assim. É mesmo um mecanismo do corpo de auto-limpeza. É também uma forma de proteção nossa, para evitar a invasão por microrganismos. Se for um muco sem cheiro, sem comichão, totalmente clarinho é perfeitamente normal. Agora, se for amarelado, já pode ser uma infeção bacteriana; se for branco, tipo iogurte/requeijão, associado com cheiro, com comichão, inchaço, vermelhidão já estamos para uma candidíase.
SR – Uma vez em conversa com a ginecologista – eu devo ser a pessoa que fica mais tempo nas consultas, porque tenho muitas perguntas… as perguntas que te coloco a ti, falo com ela. Ela é muito interessante e o que ela me dizia, em relação ao pensos higiénicos: Onde é que as pessoas vão buscar isso, de estar sujo… não! Faz parte! Deixem cuecas com sintéticos – claro que isto não é igual para todas as mulheres. Há umas que vão ser mais resistentes, se calhar, e outras que precisam sempre de usar algodão, para o corpo respirar. Então, ela dizia, você nem imagina a quantidade de mulheres que aparece aqui com uma candidíase normal provocada pelos pensos. Porque não deixam respirar, principalmente na altura do calor. Ela lá dizia: nós temos bactérias que se multiplicam porquê? Porque temos um sítio quente e húmido.
AM – É o melhor sítio para as bactérias.
SR – Dizia ela, pondo o penso não estamos a deixar respirar.
AM – E a temperatura sobe mais e o corpo para tentar compensar tem uma descarga, ainda há mais muco e depois ainda temos a proliferação de bactérias ou da cândida, do fungo.
SR – Então, ela dizia que havia já mulheres, que são pacientes, que no verão dormem nuas que é para, durante a noite, ficarem com tudo ao léu, para respirar. E ainda deu mais conselhos: as calças de ganga, é um tecido que não deixa respirar…
AM – As calças justas também não é muito adequado.
SR – Ela dizia: isto não é para todas. Estamos a falar de centenas, só pacientes delas, que chegam aqui e todos os meses têm esse problema, principalmente no verão. E que, de facto, devia-se deixar de normalizar o uso do penso e de nos deixarmos de ter – vou usar a expressão – nojo das nossas secreções.
AM – Isso da cueca imaculada, não existe! E é bom que haja muco cervical, é uma proteção e é nosso, não há que ter nojo.
SR – E agora vamos ter aqui ao nosso pé, as marcas de pensos higiénicos e tampões, mas na verdade eu penso que tu me consegues fazer melhor disso, aquilo tem produtos, por alguma razão são brancos… é essa coisa imaculada, vermos o nosso próprio sangue… não sei muito bem qual a ideia, mas de certeza que aquilo foi feito por homens…
AM – E os anúncios são sempre péssimos!
SR – Estão a melhorar, mas ainda lhes falta assim um bocadinho. Não sei se me podes dizer, eu já li em revistas que dizem que o branqueamento que é usado, tanto para o tampão como para os pensos higiénicos, não são muito bons para a nossa floral vaginal.
AM – Sim, porque tens ali um objeto estranho. Até porque os tampões… o aconselhado é até 4 horas o mesmo tampão, sob mesmo o risco de choque tóxico. Que não é muito habitual mas teres o tampão colocado mais tempo do que é suposto, que são as 4 horas e poder haver uma infeção. E que poderá ter consequências graves. Portanto, cada vez mais há mulheres adeptas de outros produtos de recolha menstrual, como é o copo. Que está na moda e há muitas mulheres a darem-se muito bem com isso.
SR – Sim, quando apareceu era uma coisa caríssima. Até me lembro de um amigo olhar para aquilo e dizer assim: mas desde 20 euros por este pedaço de silicone?
AM – Depende da marca, mas é reutilizável durante 10 anos, a maior parte deles. Fazendo bem as contas….
SR – A curto prazo ele torna-se rentável. Hoje em dia existem outros e mais baratos.
AM – Há vários tamanhos…
SR – Já há em supermercados e tudo. Mandei vir online porque era uma loja especializada. E tem também pensos recicláveis.
AM – Falando do bebés, estamos agora a voltar às fraldas reutilizáveis de pano, como se usava antigamente. Também há tampões – acho um bocadinho estranho – que são um pano, que enrolas e tem um fio como um tampão. No fim de cada aplicação ferves, lavas e esterilizas.
SR – Voltamos ao inicio da minha questão. Acho que isto desenvolveu muito pouco, para algo que faz parte da nossa vida, todos os meses… milhões de mulheres…
AM – E continua a haver muito estigma e muito tabu, para falar da menstruação, parece que é uma coisa que só acontece a alguns… casos raros!
SR – Houve uma documentário muito interessante na RTP1, também a gostava de ter aqui numa das conversas, que era precisamente isso, de se normalizar o sangue; de nos habituarmos…. nós próprias com isso… Muitas vezes há cheiros associados, porque lá está estamos mais de 4 horas com tampões ou andamos com o penso o dia inteiro, ou metade do dia. Há muita coisa associada e nem percebemos o porquê. Por isso temos de normalizar umas coisas e desmistificar outras.
AM – Lembro-me na escola, acho que agora funciona de igual forma. Era um tabu… as aulas de educação física, a natação… dizias estou menstruada, não quero ir fazer a aula… era um filme.
SR – Conheci há pouco tempo uma mulher de 45 anos. Estávamos de férias e ela dizia que não ia à piscina nem ao mar, nunca tinha experimentado, ou tinha experimentado mas não se tinha dado com tampões – quanto mais o copo, porque é mais complicado. É preciso insistência; preparação e arranjar uma fórmula. Tem de se fazer e estar num ambiente em que possamos… Por exemplo, eu lembro-me de não ter conseguido logo no inicio. E imaginava-me a viajar, em Marrocos, onde vamos a casa de banho onde não há um sítio para lavar o copo. Quando estamos em casa, é uma boa altura para começarmos a iniciar. Passados alguns meses, depois de alguma experiências…
AM – Depois torna-se um hábito. É como tudo.
SR – Mas, confesso, não vou mentir, que voltei muitas vezes aos tampões e aos pensos. Porque não posso… vou estar a sair, não vou estar a usar, se me sai… se me sujo.
AM – Com medo de extravasar sangue. Mas como tem um rebordo não há problema.
SR – Aquilo cria um vácuo e é extremamente seguro. Depois de arranjarmos a nossa forma de colocar… parece que estou a afazer aqui alta propaganda! Não foi à primeira, nem à segunda, tem de haver uma insistência. Há pouco dizias disso das hormonas mandarem na comida, não era suposto, ou de ficarmos mais irritadiças, mas a verdade é que nos mexe um bocadinho com o humor. Portanto, antes de vir a menstruação somos capazes de ficar um bocadinho mais em baixo, assim como depois, dizias tu…
MEXE COM O HUMOR
AM – Sim, mais em baixo, porque há um decréscimo das hormonas, e portanto o estrogénio e a progesterona estão em níveis muito baixinhos.
SR – É mesmo antes de aparecer o sangue da menstruação… é que se sente isso muitas vezes.
AM – A progesterona tem um pico a meio da fase lútea e depois tem um decréscimo, tal como o estrogéneo. E o facto de estarem assim, em níveis baixos, pode indicar que estejamos mais tranquilas, mais serenas. O contrário do que acontece um bocadinho antes da ovulação, quando se abre a janela fértil… estamos boas para a festa. Estamos energéticas, temos um maior libido, mais desejo sexual. Sentimo-nos mais sensuais.
SR – O nosso corpo é fantástico.
AM – E perceber isto é que é interessante. E perceber este ciclo. A parte chata é a menstruação, que toda a gente vê. Perceber o invisível é que é interessante.
SR – Vocês tinham uma coisa muito interessante, que é a mandala lunar.
AM – Há mulheres que não têm muita paciência para fazer aquilo. Quem tem e quem gosta, é a tal coisa de cruzar os indicadores. Tens que – tal como o copo menstrual – tens que insistir, e é um processo longo, ao longo de meses, de registo da tua temperatura basal, do muco cervical e do toque do colo do útero, para veres qual a janela fértil, como conseguires sinalizar alguma questão de saúde. A temperatura basal tem de ser medida, em repouso, e quando acordas e não é, muitas vezes, bem aceite.
SR – Medimos como? Com um termómetro normal?
AM – Sim, com um termómetro. Convém que seja na vagina ou no reto, porque convém que seja interna. E assim, conseguimos definir todas as fases do ciclo.
SR – Eu lia num texto vosso que todas nós somos cíclicas, mas não significa que os nossos ciclos sejam iguais.
AM – Todas nós passamos pelas fases do ciclo menstrual, mas não quer dizer que a duração dele seja igual para todas nós. Que não é. Todas passamos pelas mesmas fases e pelo mesmo ciclo, todos os meses.
SR – E agora, mito ou não: quando as mulheres estão muito juntas, os ciclos menstruais, começam a coincidir?
AM – Não! É mito! Havia muito esse mito, realmente, que os ciclos sincronizam.
SR – À medida que a idade avança vem, também outra parte chata nas mulheres que é o final da menstruação e que isso também vai implicar mudanças em nós hormonais. A menopausa.
AM – Um decréscimo do estrogénio, por exemplo, e por isso é que muitas mulheres são medicadas depois com produtos à base de estrogénio. Porque o nível baixa muito e, portanto, é necessário, para alguns sintomas que a mulheres tem, os famosos calores
SR – Que não são mito!
AM – Não, os afrontamentos são clínicos. É por causa do estrogénio baixa; a secura vaginal; a maior parte das mulheres em menopausa tem de fazer um creme vaginal, à base de estrogénio para conseguir lubrificar um pouco.
SR – Há pouco tempo com a ginecologista, perguntava-lhe que havia um outro mito: que era mulheres que não tinham tido filhos, teriam a menopausa mais cedo e eu posso posso-vos dizer que a minha ginecologista disse que era mentira. Não existe base cientifica para isso.
AM – Existe relação em não ter filhos e o cancro da mama. Porque o cancro da mama é hormono-dependente, e pode ser que o facto de amamentar reduz muito o risco de futuro cancro da mama. Em relação ao que falaste não há base cientifica.
SR – Gostaria também que me falasses um bocadinho de… neste caso é mais um conselho para mulheres mais jovens, adolescentes, que nos estejam a ouvir agora, para elas não cometerem muitos dos erros que cometemos. Depois de amanhã vou estar com a Celine, e vamos falar sobre a pílula. Terá o seu lado bom, mas acho que nunca se fala do lado mau.
AM – Abrindo um bocadinho o tema, deixo para a Celine, a sociedade tende muito a normalizar isso, que todas as mulheres têm de tomar a pílula. Isto é quase um dado adquirido. E tomam a pílula durante 10/20 anos. E é o que eu dizia há pouco, voltando um bocadinho atras. O mecanismo primário é impedir a ovulação; se não há ovulação, não há óvulo liberdade e não há fecundação. Portanto, a pílula tira-se o ciclo, é abolido, só é alimentado no útero. E depois tens a chamada hemorragia de privação na pausa da pílula
SR – Que não é menstruação…
ENDOMETRIOSE
AM – Não é menstruação. Chama-se hemorragia de privação, porque ficas privada das hormonas sintéticas que está a dar ao longo do mês. Nem tem todas as perdas de sangue que nós temos são menstruação. Falando da pílula. Muitas vezes chegam ao médico e todas as queixas são tratadas com a pílula: tens acne, tens fluxo intenso, tens ciclos irregulares, tens excesso de pelo… não querendo ser injusta, mas tendencialmente é isto que acontece, porque a sociedade está assim programada. E o problema disto é que possamos estar a camuflar um problema por trás; como eu dizia, todos os sinais que o corpo dá é algo que não está bem e, portanto, se tens acne temos de ver porque é que tens acne e que desequilíbrio hormonal tens; etc. São essas questões que têm de ser vistas, porque às vezes, a pílula vai camuflar um problema de saúde. Uma endometriose, a síndrome dos ovários poliquísticos, por isso antes de tomarem a pílula, por favor informem-se.
SR – Como estamos especialmente a falar com jovens, que vão a primeira vez ao médico, vão com a mãe, e se as mães estiverem a ouvir, façam perguntas. A primeira pílula que eu tomei foi a Diane 35, foi retirada do mercado porque morreram mulheres em França com tromboses, tromboflebites…. Só para nós pensarmos um bocadinho nisto. No que estamos a tomar. E quando lermos a bula da pílula percebemos o que possa estar em causa.
AM – A pílula foi revolucionária. Não quero com isto ter aqui um discurso anti-pílula.
SR – Ela terá coisas boas…
AM – E para fins reprodutivos é dos melhores métodos contracetivos. Mas para outras questões – principalmente para questões de saúde – podemos estar a camuflar. Por isso é que a endometriose, tem um diagnóstico de 8 a 10 anos; demora-se em média 8 a 10 anos a descobrir até um diagnóstico correto de endometriose. E a mulher anda com dores menstruais horríveis, mas passam com a pílula…
SR – Na endometriose, que tipo de dores e doenças estamos a falar?
AM – A endometriose é o aparecimento de células do endométrio, que é o revestimento do útero noutras zonas do corpo. Por exemplo, no intestino, às vezes até no pulmão; tal como no útero vai espessar até à ovulação e vai descamar na menstruação. Por isso é que há muitos sintomas, de endometriose que é doença ginecológica com sintomas que mão têm nada a ver, com sintomas completamente díspares como obstipação, com diarreias, com falta de ar, com tosse e que, às vezes, nem se associa que é uma doença ginecológica qu estás por detrás.
SR – Muito bem! Tanta informação, tão rica, muito obrigada Alia! Fica aqui mais uma das Conversas do Confinamento.
– FIM –